quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Liberalismo constitucional 1826-1926 : O Pensamento político de Luís Magalhães

Não posso deixar passar o Natal sem recomendar este livro que é literalmente a minha bíblia de cabeceira pela extraordinária e imensa colecta de informação que traz, e também por mostrar ainda um pensamento monárquico que se tornou fora de moda, e até foi anátema para o movimento monárquico português do século XX.



Com o surgimento da 1ª república deu-se o advento do "integralismo lusitano", com todo um corpo de jovens académicos de Coimbra como António Sardinha, Alfredo Pimenta, Hipólito Raposo etc., que o impulsionaram e deram propaganda. A génese da doutrina originou dum movimento romântico de índole nacionalista, com raízes no miguelismo e que defendia um regresso a uma monarquia mais personalista, católica, corporativizada, ou "orgânica", e anti-parlamentar.

Isto surgiu como reacção natural àquilo que estes vários integralistas viam que era o falhanço do modelo liberal que seria demasiado democrático, uma "importação estrangeira" que foi usada à força na política nacional.

Salazar sempre simpatizou com estes novos monárquicos, ou melhor dizendo, usou-os para seu benefício dando-lhes um ou outro ministério e ao mesmo tempo calava qualquer possibilidade de restauração monárquica sob a égide da "união nacional".

Naturalmente poucos desta nova geração sabiam ou compreendiam qual era a génese e a verdadeira legitimidade monárquica que emanava do liberalismo constitucional. Luís Magalhães, ministro regenerador da velha monarquia, e um conservador liberal pleno, foi dos poucos e brilhantes resistentes que defenderam intelectualmente a doutrina liberal no pensamento monárquico.

Ele próprio admite e refere nesta obra que há todo um intervalo geracional que separa os monárquicos "novos" da geração mais velha que viveu sob a vigência da Carta Constitucional. As novas gerações são, segundo ele, cheias de idealismo à mistura com "muita treta, muito chanfalho...".

A clivagem liberal/absolutista do início do século XIX é transposta no século XX para o confronto entre os defensores do constitucionalismo parlamentar, muitos destes haviam sido ex-ministros do Reino, e os "novos monárquicos" que advogavam o regresso as raízes da monarquia, num contexto nacional-radical.


A clivagem é levada ao extremo aquando da morte inesperada de D. Manuel II em 1932. A Causa Real e as confederações monárquicas aclamam D. Duarte II como seu sucessor. Luís Magalhães terá sido provavelmente o único opositor a esta transferência de lealdade. Num acto pouco racional e incaracterístico da sua pessoa chega a escrever que o comportamento demonstradamente traiçoeiro da linha miguelista o faz preferir escolher os príncipes saxões descendentes de D. Luís I ou um qualquer ramo brasileiro como sendo mais acertados do que a escolha aparente (cf. Amaro Monteiro, Salazar e o Rei (que não reinou)).


Nesta obra editada por Luís Lóia, Magalhães desconstrói item por item todos os argumentos contra a legitimidade de D. Pedro IV e da Carta Constitucional bem como algumas tácticas propagandistas do integralismo lusitano. Ao mesmo tempo, neste ensaio, toda a doutrina monárquica moderna já previamente disseminada por ilustres como Benjamin Constant, Walter Bagehot entre outros, é re-afirmada duma maneira eloquente se bem que, à data em que foi escrita (1927), acaba por caír em ouvidos surdos pelo zeitgeist lhe ser adverso.