terça-feira, 29 de julho de 2008

Sobre monárquicos

Na entrevista que Marcelo Rebelo de Sousa deu ao Magazine Grande Informação este afirma "os nossos monárquicos - com raras e honrosas excepções - foram mais legitimistas e integralistas do que liberais [...] restaria encontrar à direita um espaço redescoberto ou reconstruído de monárquicos liberais [...]".
Sobre esta afirmação é custoso admiti-lo mas é verdade.

Os monárquicos nunca recuperaram da guerra civil que dividiu as duas causas e ao contrário do que sucedeu em Espanha as divisões não sararam com o tempo, agravaram-se até com a instauração da república tendo os ministros e todo o corpo do executivo revelado uma impotência geral em acalmar insurreições armadas e inabilidade em defender o regime. Neste panorama o legitimismo revela-se como o farol da ordem e da tradição, um regresso às raízes algo utópico, acalentado por ideologias nacional-socialistas que entretanto entram em voga pela Europa.

Mas a causa liberal não morreu. Ela subsiste ainda apesar de ser discreta. Com isto não quero dizer que ainda hajam absolutistas nos dias de hoje. Existe uma elite intelectual nos círculos monárquicos que são confessamente liberais, entre eles Augusto Ferreira do Amaral (barão de Oliveira Lima) e Luís Aguiar Santos.

Simplesmente a rixa entre lealistas e legitimistas transpôs-se agora para a dualidade tradicionalismo versus modernismo. E isto define-se na postura e na defesa dos valores que os monárquicos defendem.

Ocorre-me neste momento a dissidência organizada por Nuno da Câmara Pereira tendo como pretendente principal ao trono português, o seu primo o duque de Loulé. Isto é reflexo dum mau-estar já imbuído e, desde há muito tempo, presente no meio monárquico. O ataque vitriólico e pessoal que o Sr Pereira lançou contra o príncipe D. Duarte é um sinal de inquietitude entre os círculos tradicionalistas. Por monárquico tradicionalista entenda-se fadista, marialva, machista, misógeno, temente a Deus e defensor da família (no pior sentido). Designadamente com doutrinas que oscilam entre a social-democracia e municipalismo até à defesa da monarquia católica, "orgânica" e integralista defendendo o velho contratualismo entre o poder monárquico e os cidadãos, define-se assim o "monárquico tradicionalista". Esta descrição é em quase tudo um estereótipo, um lugar comum.

Lançando os olhos pelo livro "Usurpador" vislumbram-se ataques pueris à pessoa de Sua Alteza Real, como a possibilidade de um genro seu pertencer a uma loja maçónica e de D. Isabel descender dum republicano notável no seu tempo, o visconde da Ribeira Brava e há também a história anedótica de como Nuno da Câmara Pereira decidiu auto-intitular-se Comendador-Mór duma ordem honorífica criada durante o absolutismo.

Se calhar estou a ir longe de mais ao dizer isto mas parece-me irónico que o herdeiro da linha miguelista é hoje liberal e o herdeiro da linha liberal (Loulé) o tradicionalista.

Sobre a pretensão em si do duque de Loulé já discuti aqui. Julgo que numa perspectiva séria tem algum peso mas na letra da lei é a de D. Duarte que tem mais força. Assim o julgaram também os monárquicos em 1932 e outra vez em 1976.

A clivagem lealista/legitimista ainda existe no meio monárquico e ainda está bem acesa. Não beneficia a causa mas persiste.

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